OS DESBRAVADORES
Capítulo 47
Calfilho
XLVII
Mais três dias de viagem e alcançaram
Dakar, na costa africana. A capital do Senegal, colônia francesa, era um porto
movimentado do Atlântico, na África.
Quando desembarcaram, os cinco
companheiros de viagem ficaram surpresos com o número de pessoas que os assediaram,
oferecendo suas mercadorias, indicando-lhes passeios, bares e restaurantes.
Quase não podiam andar, tamanho o número de negros, com suas vestes compridas
que iam até os pés, atravancando-lhes o caminho.
Compraram uma bugiganga aqui, outra
ali, conseguindo a muito custo desvencilhar-se dos importunos. Ficaram por ali
mesmo, nas imediações do porto, não se atrevendo a conhecer melhor a cidade. Além
de não desejarem gastar o pouco dinheiro que levavam, o navio também não iria
demorar muito tempo em Dakar. Somente o tempo necessário para o reabastecimento
de combustível e o carregamento de alguma mercadoria perecível, que se
destinaria ao consumo dos passageiros.
Fizeram o que estavam acostumados: um
passeio pelas ruas estreitas da região do cais, um trago ou outro num boteco
escondido. Joaquim, mais precavido, preparou três sanduíches de salame no café
da manhã do navio, levando-os com ele. Tendo bom coração, dividiu a pequena
refeição com os amigos. Manolo, como de hábito, comprou três pacotes de
cigarros senegaleses.
Enquanto bebiam alguns copos de vinho
em pé, junto ao balcão engordurado de um barzinho da cidade, Joaquim contava
suas mágoas:
– Eu tenho que arranjar logo um bom
dinheiro no Brasil. Minha família está até o pescoço de dívidas.
– Você vai para qual cidade, Joaquim?
– perguntou Miguel.
– Vou ficar no Rio de Janeiro –
respondeu. – Meu cunhado, casado com minha irmã, tem um estabelecimento num
subúrbio da cidade. Acho que se chama Encantado... ou coisa parecida.
– Então, vais trabalhar para o teu
cunhado... Esse estabelecimento é de quê? – perguntou Antonio.
Joaquim olhou para ele
interrogativamente.
– Não entendi... estabelecimento de quê?
– O que faz esse estabelecimento?
Vende o quê? É um bar? Um restaurante? – esclareceu Antonio.
– Ah! sim – retrucou Joaquim. – É um
armazém de secos e molhados.
– E você sabe onde fica esse
subúrbio? O Encantado?
– Não tenho a mínima ideia. Espero
que seja junto da praia para que eu possa admirar as cachopas – respondeu, com
um sorriso nos lábios.
– Acho difícil – duvidou Manolo. –
Subúrbio geralmente é lugar afastado, longe de tudo que é bom.
– Lá em Portugal, você vivia com
quem, Joaquim? És casado? Tens filhos? – perguntou Miguel.
– Não, sou muito novo para isso –
respondeu Joaquim, sorrindo. – Vivia com meus pais e meus irmãos, que são oito.
– Puxa vida, parecido comigo. –
comentou Manolo. – É muita gente para sustentar.
– A gente tem uma pequena propriedade
lá em Trás-os-Montes. Mas, com o frio, a lavoura não tem dado nada. O nosso
gado, que já era pouco, agora quase não dá leite. Cinco cabeças, apenas.
Tínhamos algumas cabras, mas fomos obrigados a vender. Emprego não se arranja.
Fui tentar a sorte nas cidades próximas, cheguei a passar fome – lamentou-se
Joaquim.
– É, está duro mesmo – filosofou
Raphael. – Acho que nós todos temos uma história parecida. Ninguém sai de sua
terra porque quer.
Cada um deles trazia consigo um
passado de tristeza, de amargura, de sofrimentos. E, agora, quando alguns
encerravam a segunda década de vida e outros iniciavam a terceira, partiam cheios
de esperanças para o desconhecido, para a terra nova que lhes abria as portas,
oferecendo-lhes um futuro promissor e uma vida menos sacrificada.
Na volta ao navio foram novamente
cercados pelos negros senegaleses oferecendo-lhes colares, pulseiras e outros
objetos típicos da região. Falavam francês, a língua de seus colonizadores.
Manolo saía gritando em espanhol:
– Não compreendo, não compreendo –
afastando de perto dele os vendedores.
Nem os nativos também compreendiam o
que ele dizia...
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