terça-feira, novembro 01, 2016

OS DESBRAVADORES Capítulo 25



OS DESBRAVADORES

Capítulo 25

Calfilho




XXV






A chuva continuou com a mesma intensidade no dia seguinte.
Faustino já não aguentava de impaciência. Parecia, como bem observou Maria Teresa, uma fera enjaulada, andando nervosamente de um lado para outro, sem saber que decisão tomar.
Sabia que era impossível seguir viagem com aquelas condições de tempo. Já eram famosas as histórias de gaiolas que afundavam no Amazonas em dias como aquele, não conseguindo vencer a fúria das águas revoltas do rio-gigante.
E, ficar ali parado representaria prejuízo na certa. Alguns víveres poderiam apodrecer, o prazo para entrega da primeira carga de borracha iria atrasar, os fretes já marcados teriam que ser reformulados com conseqüentes multas, etc..., etc...
À noite, já não suportando mais aquela chuva que não parava, resolveu aceitar um convite de madeireiros e gente de dinheiro da cidade para um joguinho de pôquer.
Antes do casamento, havia prometido a Maria Teresa que não jogaria mais, pelo menos até voltarem a Fortaleza. Ela já tinha ouvido vários comentários de como ele fizera fortuna nas vezes anteriores em que fora a Amazônia e perdera quase tudo nas mesas de jogo. Ele, que pretendia realmente mudar de vida com o casamento, fez-lhe a promessa.
Ainda bem que quando um dos madeireiros foi convidá-lo para uma rodada de pôquer à noite, ela estava ao seu lado.
Estavam sentados nas mesmas cadeiras de palha da tarde anterior. Vigiavam a chuva que continuava caindo sem cessar à sua frente.
O homem aproximou-se, tirou o chapéu e falou respeitosamente:
– Meu senhor, minha senhora, boa tarde. Meu nome é Florisvaldo, sou morador da cidade.
Faustino retribuiu o cumprimento com a cabeça. Ficou olhando interrogativamente para o homem. Este continuou:
– Soube que o senhor é um grande jogador de pôquer. Como vai ser difícil prosseguir viagem antes desta noite, vim convidá-lo para uma mesa de jogo mais tarde.
Faustino continuou fitando o homem. Seus olhos brilharam por um instante. Olhou rapidamente para Maria Teresa antes de responder:
– Não, obrigado, meu amigo. Já estou afastado do jogo há muito tempo, estou meio enferrujado...
Maria Teresa interveio:
– Vai, Faustino, aceita o convite. Talvez isto te faça bem, te acalme um pouco.
Ele perguntou:
– Você tem certeza, Teresa? E a promessa que eu te fiz?
– Faz de conta que eu não sei de nada. Mas, olha, tem um limite, ouviu? 
Ele levantou-se rapidamente, deu um beijo na testa da mulher. Virou-se para Florisvaldo:
– Então está bem, meu amigo – disse, estalando os dedos de satisfação. – Vai ser bom desenferrujar um pouco os ossos da mão. A que horas começamos?
– Logo depois do jantar, lá pelas nove, está bem para o senhor?
– Perfeitamente, estarei à espera.
O largo sorriso voltou a brilhar-lhe nos lábios.
Foi tomar um longo banho de água quente, numa banheira de porcelana que havia em seu quarto. Maria Teresa também tomou um banho depois do marido, enquanto este se vestia com apuro.
Às sete da noite desceram para o salão de jantar.
Comeram vagarosamente, acompanhados de Morais. Faustino já estava descontraído, rindo alegremente, contando piadas, sendo todo gentilezas com a mulher. Às nove em ponto, quando saboreavam a sobremesa de doces de frutas variadas, Florisvaldo entrou no salão. Cumprimentou os três e disse:
– “Seu” Faustino, estamos ao seu dispor. Quando quiser, podemos ir. Mas, acabe antes sua sobremesa.
Faustino convidou-o a sentar-se e também experimentar um pouco do prato de doces.
Depois que acabaram, pediu licença e acompanhou Maria Teresa até o quarto.
Na porta, despediu-se:
– Até já, minha querida. Prometo que não volto muito tarde.
Desceu as escadas e acompanhou Florisvaldo até o salão de jogos, que ficava nos fundos do próprio hotel, num ambiente reservado.
A chuva lá fora continuava caindo. Forte, sem cessar.


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