OS DESBRAVADORES
Capítulo 25
Calfilho
XXV
A chuva continuou com a mesma intensidade no dia
seguinte.
Faustino já não aguentava de impaciência. Parecia,
como bem observou Maria Teresa, uma fera enjaulada, andando nervosamente de um
lado para outro, sem saber que decisão tomar.
Sabia que era impossível seguir viagem com aquelas
condições de tempo. Já eram famosas as histórias de gaiolas que afundavam no
Amazonas em dias como aquele, não conseguindo vencer a fúria das águas revoltas
do rio-gigante.
E, ficar ali parado representaria prejuízo na certa.
Alguns víveres poderiam apodrecer, o prazo para entrega da primeira carga de
borracha iria atrasar, os fretes já marcados teriam que ser reformulados com
conseqüentes multas, etc..., etc...
À noite, já não suportando mais aquela chuva que não
parava, resolveu aceitar um convite de madeireiros e gente de dinheiro da
cidade para um joguinho de pôquer.
Antes do casamento, havia prometido a Maria Teresa que
não jogaria mais, pelo menos até voltarem a Fortaleza. Ela já tinha ouvido
vários comentários de como ele fizera fortuna nas vezes anteriores em que fora
a Amazônia e perdera quase tudo nas mesas de jogo. Ele, que pretendia realmente
mudar de vida com o casamento, fez-lhe a promessa.
Ainda bem que quando um dos madeireiros foi convidá-lo
para uma rodada de pôquer à noite, ela estava ao seu lado.
Estavam sentados nas mesmas cadeiras de palha da tarde
anterior. Vigiavam a chuva que continuava caindo sem cessar à sua frente.
O homem aproximou-se, tirou o chapéu e falou
respeitosamente:
– Meu senhor, minha senhora, boa tarde. Meu nome é
Florisvaldo, sou morador da cidade.
Faustino retribuiu o cumprimento com a cabeça. Ficou
olhando interrogativamente para o homem. Este continuou:
– Soube que o senhor é um grande jogador de pôquer.
Como vai ser difícil prosseguir viagem antes desta noite, vim convidá-lo para
uma mesa de jogo mais tarde.
Faustino continuou fitando o homem. Seus olhos
brilharam por um instante. Olhou rapidamente para Maria Teresa antes de
responder:
– Não, obrigado, meu amigo. Já estou afastado do jogo
há muito tempo, estou meio enferrujado...
Maria Teresa interveio:
– Vai, Faustino, aceita o convite. Talvez isto te faça
bem, te acalme um pouco.
Ele perguntou:
– Você tem certeza, Teresa? E a promessa que eu te
fiz?
– Faz de conta que eu não sei de nada. Mas, olha, tem
um limite, ouviu?
Ele levantou-se rapidamente, deu um beijo na testa da
mulher. Virou-se para Florisvaldo:
– Então está bem, meu amigo – disse, estalando os
dedos de satisfação. – Vai ser bom desenferrujar um pouco os ossos da mão. A
que horas começamos?
– Logo depois do jantar, lá pelas nove, está bem para
o senhor?
– Perfeitamente, estarei à espera.
O largo sorriso voltou a brilhar-lhe nos lábios.
Foi tomar um longo banho de água quente, numa banheira
de porcelana que havia em seu quarto. Maria Teresa também tomou um banho depois
do marido, enquanto este se vestia com apuro.
Às sete da noite desceram para o salão de jantar.
Comeram vagarosamente, acompanhados de Morais.
Faustino já estava descontraído, rindo alegremente, contando piadas, sendo todo
gentilezas com a mulher. Às nove em ponto, quando saboreavam a sobremesa de
doces de frutas variadas, Florisvaldo entrou no salão. Cumprimentou os três e
disse:
– “Seu” Faustino, estamos ao seu dispor. Quando
quiser, podemos ir. Mas, acabe antes sua sobremesa.
Faustino convidou-o a sentar-se e também experimentar
um pouco do prato de doces.
Depois que acabaram, pediu licença e acompanhou Maria
Teresa até o quarto.
Na porta, despediu-se:
– Até já, minha querida. Prometo que não volto muito
tarde.
Desceu as escadas e acompanhou Florisvaldo até o salão
de jogos, que ficava nos fundos do próprio hotel, num ambiente reservado.
A chuva lá fora continuava caindo. Forte, sem cessar.
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