COMPARAÇÕES
INFELIZES...
Calfilho
Uma
das coisas mais perigosas, quase infeliz, que se pode fazer no futebol, é
querer comparar qualidade de jogadores tidos como craques em seus times ou
seleções. Arriscamo-nos a cometer graves injustiças que nem nós mesmos
conseguimos perceber.
Isso
porque não se podem comparar coisas diferentes, apesar da aparente semelhança
que possam ter. Quando se tenta fazer a comparação entre jogadores de um mesmo
time ou de uma mesma seleção, temos que atentar, em primeiro lugar, se jogaram
ou não na mesma época. Depois, se a posição dos dois era exatamente a mesma, ou
seja, idêntica a função que exerciam em campo. E, em terceiro lugar, se os
times em que jogaram tinham a mesma qualidade técnica, ou seja, se os jogadores
que se quer comparar tinham ao seu lado outros atletas do mesmo nível de
qualidade de futebol. Isso porque, não esqueçamos, trata-se de um esporte
coletivo, nunca individual.
Mesmo
que um jogador seja tecnicamente bem superior aos demais, vai ser o trabalho em
conjunto, em equipe, que vai determinar o sucesso ou o fracasso do time. O
“fora-de-série” pode até desequilibrar um jogo ou outro numa jogada genial e
decidir uma partida. Mas, não fará isso sempre e, se seus companheiros de
equipe não colaborarem com ele, sua genialidade vai ficar limitada a apenas
alguns lances esporádicos. Agora, se alguns dos outros jogadores também tiverem
uma técnica de razoável para boa, aí sua individualidade vai aparecer muito
mais.
Já
vi várias discussões sérias (algumas até transformaram amizades em inimizades)
sobre quem seria melhor: Pelé ou Garrincha? Pelé ou Maradona? Maradona ou
Messi? Zico ou Dida? Gerson ou Didi? Ademir da Guia ou Rivelino?
Pena
que, de uns anos para cá, as comparações ficaram mais pobres... A não ser,
talvez, Neymar, a nova safra de “craques” não empolga tanto... quando assistimos
a atual seleção brasileira entrar em campo e vemos tantos jogadores
desconhecidos, que estão fazendo suas carreiras na Europa, alguns tendo jogado
apenas uma temporada aqui no Brasil (ou nem isso), não podemos realmente ficar
animados...
O
mal dessas comparações é que cada um de nós tem sua opinião e acredita piamente
que ela é a correta, sem admitir contestações.
Deixem-me
dar a minha.
Pelé
ou Maradona? Para mim, Pelé. Primeiro, porque ganhou três Copas do Mundo,
apesar de ter jogado pouco tempo na de 1962. Maradona só ganhou uma. Os dois
foram “pontas de lança” (como preferem alguns), ou “meias avançados” (como
preferem outros). Pelé sempre foi mais objetivo, jogava mais visando o gol, fez
do Santos um dos maiores times do mundo no início da década de 60. Maradona,
mais individualista, “cracaço” de bola, fez do Nápoli, time que nunca chegava
ao título, campeão da Itália por duas vezes. O gol que fez contra a Inglaterra
na Copa de 86, no México, foi um dos mais bonitos já vistos na história do
futebol. Pelé teve ao seu lado Coutinho, Pepe, Mengalvio, Zito, Carlos Alberto.
Maradona teve Alemão, Careca, Batistuta e tantos outros extraordinários
jogadores argentinos.
Garrincha
ou Pelé? Para mim, Garrincha. Pela genialidade, pelo improviso, por ter ganho
duas Copas do Mundo, a de 1962 levando o time nas costas após a contusão de
Pelé na segunda partida da fase eliminatória. Jogavam em posições diferentes,
mas Garrincha, que foi o maior ponta-direita que vi jogar (perdoem-me Julinho Botelho
e Stanley Mathews), além de infernizar defesas, na Copa de 62, fez gol de falta
e até de cabeça. Pelé ganhou três Copas, mas era muito mais novo que Garrincha.
Este último jogou ao lado de Didi, Quarentinha, Paulinho Valentim, Manga, além
de Pelé, Zito, Pepe, Vavá, Dida... Garrincha, para mim, foi o maior gênio do
futebol mundial, embora ache que ele nem se dava conta disso...
Maradona
ou Messi? Maradona, na minha opinião. Também pela improvisação, pelo domínio de
bola, pela genialidade. Messi, apesar de ser um “baita” jogador já tem outro
estilo, já que foi ainda adolescente para a Europa e lá adaptou seu futebol ao
estilo europeu, sendo mais objetivo, pragmático, apesar de às vezes também
improvisar. Nunca deu sorte jogando pela seleção do seu país.
Zico
ou Dida? Para mim, Dida (sei que vou ser xingado por esta opinião, inclusive
por um familiar, flamenguista doente). Mas, acompanhei a carreira dos dois
desde o início. Vi Dida estrear pelo Flamengo, juntamente com Babá, acho que no
tricampeonato do rubro-negro de 1955. Sempre foi um jogador brilhante,
artilheiro nato, decidindo jogos importantes para o seu time. Zico, mais
recente, também excelente jogador, irmão mais novo de outros atacantes de
sucesso (na minha opinião, Edu, o melhor deles) é mais idolatrado pela torcida
do Flamengo por ter ficado mais conhecido e porque a mídia o promoveu muito.
Edu, por ter jogado quase toda sua carreira no América, não teve tanta
projeção, mas foi um senhor jogador.
Gerson
ou Didi? Para mim, Didi. Conheci Gerson quando tinha doze anos de idade, ele,
acho que dois anos mais velho do que eu. Treinávamos futebol de salão no Canto
do Rio, em Niterói, ele já despontando como uma grande revelação do futebol da
época. Em 1955, ele disputou os Jogos Infantis pelo clube (jogos patrocinados
pelo então Jornal dos Sports) pelo time até quinze anos de idade, formando ala
com Jardel, que depois jogou por vários clubes, inclusive Internacional e
Fluminense). Deram um show de bola e ganharam facilmente o torneio. Eu, nem me
atrevi a disputar pelo time de até 13 anos, onde teria poucas chances de ser
titular (Carlos Pio jogava nesse time) e preferi participar do torneio de tênis
de mesa, que também praticava no clube. Gérson teve carreira meteórica,
passando para o juvenil do futebol de campo do Canto do Rio e depois transferindo-se
para o Flamengo. Excelente visão de jogo, passe de primeira, sempre encontrando
um jogador desmarcado. Jogou pelo meu Botafogo, pelo São Paulo e encerrou a
carreira no Fluminense. Didi, quase dez anos mais velho, era o rei do meio de
campo. O “Príncipe Etíope”, como o chamava Nelson Rodrigues. Jogou pelo
Madureira, depois Fluminense, campeão carioca pelo Botafogo em 1957, bicampeão
do mundo pela seleção brasileira em 1958 e 1962, foi tentar o sucesso no Real
Madrid, não se adaptou, voltou ao Botafogo onde chegou a jogar algumas partidas
ao lado do Gérson, no que foi chamado na época de “super meio de campo”. Ficou
pouco tempo, foi ser técnico no Peru. Célebre ficou sua atitude num jogo da
Copa do Mundo de 1958, quando, após o Brasil levar um gol, foi até o fundo das
redes, pegou a bola, colocou-a debaixo do braço e, calmamente, em passos
estudados, foi andando com ela até o meio do campo para dar nova saída. O
Brasil virou o jogo e ganhou por 5 X 2. Grande craque.
Ademir
da Guia ou Rivellino? Prefiro Ademir da Guia. Estilo clássico, muito tranquilo,
domínio de bola extraordinário, para mim um dos grandes injustiçados na seleção
brasileira. Jogou na mesma época de Gérson e Rivellino, que tinham muito mais
cobertura da mídia (carioca e paulista), por isso era sempre preterido nas
convocações da seleção. Filho do extraordinário Domingos da Guia, um dos
maiores zagueiros do Brasil das décadas de 30 e 40, começou no Bangu e foi
ainda muito novo para o Palmeiras, onde construiu sua carreira. Rivellino, cria
do Corinthians Paulista, era adorado pela torcida do clube, ganhou o apelido de
“Garoto do Parque”, também excelente meio de campo. Diferente de Ademir,
temperamento explosivo, irritadiço, nunca conseguiu se firmar na seleção
brasileira, até que, em 1970, Zagallo o colocou para jogar na ponta esquerda,
como um ponta recuado, como ele próprio, Zagallo, jogara em seus tempos de
Flamengo, Botafogo e seleção. Adaptou-se bem à função e foi um dos melhores
jogadores da seleção campeã mundial de 1970. Já na seleção de 1974, titular
absoluto do meio de campo, não alcançou o mesmo sucesso. Jogou no Fluminense e
fez muito sucesso com a camisa tricolor.
Poderíamos
tentar fazer outras comparações. Domingos da Guia ou Djalma Dias (este último,
o melhor zagueiro que vi atuar; não vi Domingos).
Leônidas da Silva, Heleno de Freitas ou Ademir
Menezes? Não vi Leônidas; Heleno, só vi a última partida que jogou (meio tempo,
pois foi expulso, em 1950, com a camisa do América, no Maracanã); Ademir,
realmente, o melhor centro avante que vi jogar. Queria ter visto Heleno em seu
auge, na década de 40.
Zizinho
ou Didi? Para mim, Zizinho, que também vi jogar já em final de carreira, pela
equipe do Bangu.
De
tudo o que comentei, resumo: comparações são sempre difíceis, traiçoeiras, até
mesmo infelizes. Tudo depende de preferências pessoais, clubísticas, época em
que jogaram, estilo de jogo de cada um, qualidade dos companheiros de time...
Mas,
como futebol é paixão, cada um se apaixona como acha melhor...
Um comentário:
Pelé ou Maradona? Pelé; Dida ou Zico? Zico; Didi ou Gérson? Didi; Rivelino ou Ademir da Guia? Rivelino. Didi ou Zizinho? Zizinho; Pelé ou Garrincca? Os dois, que eu não sou bobo.
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