A QUARENTENA...
Calfilho
Obrigado a ficar em casa,
respeitando uma quarentena determinada pelas autoridades sérias deste país,
pela medicina e pelo bom senso, tendo em vista a gravidade da pandemia que
assola o mundo, uma de minhas atividades diárias, além da leitura e de assistir
um bom filme, é a de ficar vendo os noticiários da televisão sobre a
“gripezinha”.
Já vi e ouvi de quase tudo,
nesses já onze dias de reclusão domiciliar.
Vi novas profissões surgirem.
Daqui a pouco vão incluir no currículo de nossas faculdades a cadeira de
professor de “lavagem das mãos”. Já repararam como apareceram em nossas
telinhas pessoas (de ambos os sexos) ensinando-nos como lavar corretamente
nossas mãos? “Lavem os dedos, lavem entre eles, lavem as unhas, o dorso das
mãos, os punhos, etc...”, um pretendendo saber mais que o outro, virando as
ditas cujas mãos de uma maneira diferente, apenas para dizer que o seu método é
o que está certo, os outros estão errados... Como se nunca antes tivéssemos
lavado nossas mãos... Já disse, daqui a pouco vamos ter alguns brasileiros
formados em “lavagem de mãos” e, se fizerem doutorado, vão exigir serem
chamados de doutores, como acontece com outras profissões ultimamente...
Os médicos infectologistas,
também, passaram a lotar os estúdios das emissoras de televisão, respondendo
perguntas dos telespectadores, com informações nem sempre coincidentes sobre o
problema da epidemia, ou seja, como se
pega a gripe, sua transmissão, as medidas preventivas, o que é certo e o que é
errado fazer... E, com o grave risco de informar mal a população, já que a
televisão entra em qualquer casa, a dos que estudaram e a daqueles com menor
grau de instrução...
Vem o Ministro da Saúde, que
deveria ser a autoridade máxima na matéria, e diz, inicialmente, que devemos
manter isolamento, evitar aglomerações, não ir a restaurantes (pedir entrega em
casa), manter uma distância mínima de dois metros de outra pessoa, que os
ônibus só devem transportar passageiros sentados, etc... etc...
Depois, em cadeia nacional de
rádio e televisão, o Presidente da República, que deveria ser o guia maior do
povo nesse momento gravíssimo de crise mundial, afirma que o isolamento deve
ser apenas para os idosos, pois são eles que estão morrendo em outros países.
E, que as crianças (para ele, imunes ao vírus) devem voltar para a escola, que
o comércio, a indústria e as demais atividades econômicas devem funcionar
normalmente, dando como exemplo ele próprio (que diz ter sido “atleta”- aliás
não explicou o esporte que teria praticado) e, se escapou de uma facada, não
seria uma “gripezinha” que iria derrubá-lo... Talvez tenha esquecido que a
grande maioria do povo brasileiro não é composta de “atletas” e, que mesmo
eles, os verdadeiros atletas, também são atingidos pelo vírus e também morrem,
como aconteceu com alguns deles mundo afora...
Depois, em entrevista
coletiva, transmitida ao vivo pelas televisões, o Presidente, o Ministro da
Saúde e outros ministros, espalhados por uma grande mesa, portando máscaras,
fizeram-me relembrar a pintura famosa de Da Vinci, a “Última Ceia”, que se
encontra numa igreja de Milão... As máscaras atrapalhavam, eram retiradas do
rosto quando alguém falava, depois recolocadas desajeitadamente no
palestrante...
Daí em diante, o “samba do
crioulo doido”, imortalizado pelo saudoso Sérgio Porto... Entrevistas diárias,
ora pregando o isolamento vertical, ora o horizontal (aliás, quem vai acabar na
“horizontal” somos nós... definitivamente), medidas provisórias assinadas e
revogadas logo em seguida, Presidente convocando o povo para manifestações em
seu favor, desmentindo logo em seguida essa convocação, para, no dia seguinte,
misturar-se a alguns fanáticos que se dizem seus apoiadores (até quando?),
novos espetáculos de bota e tira máscaras em entrevistas televisadas, e...
Desorientação total...
O pobre do Ministro da Saúde,
que até parecia competente e bem intencionado, vê-se desmentido em suas
orientações de isolamento das pessoas pelo seu chefe. Não é somente médico,
também é político... Tenta contemporizar, achar um meio termo, mas, até quando?
Só espero que a razão e o bom
senso prevaleçam e não cheguemos ao número de mortos da Espanha, da Itália, da
China, do Iran ou dos Estados Unidos... Que consigamos seguir o exemplo da
Coreia do Sul, do Japão, de Cingapura que, tomando medidas muito duras e
severas no início da pandemia em seus países, conseguiram manter um controle
razoável sobre ela e choraram menos mortes...